sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Sempre via a escada sem enxergar os degraus



Hoje tive que ir embora... Levei pouca coisa. Mas para todos aqueles que partem, foi sempre assim. Fiz um grande esforço para adquirir o que acumulei, alguns bens materiais e outros que não sabemos estimar verdadeiramente o seu valor.
Abri aquela porta e desci a escada. Naquele momento vi que era impossível voltar. Nunca fui uma chave, mas abri e fechei muitas portas em minha efêmera vida, pode acreditar. Nunca fui água e terra, mas fiz crescer muitas flores, gerei muitos frutos, enfeitei muitos jardins...
Antes de abri a porta, olhei minuciosamente para tudo que ali estava. Acho que deixei o suficiente e necessário. Não vou mais precisar disso. Mas eu não te vi lá. Perdoe-me em ter que ir embora sem me despedir. Lamento de não ter deixado o meu último sorriso, meu último adeus...
Apesar de ter subido e descido várias vezes aquela escada, nunca percebi o que estava escrito em cada um daqueles degraus.

Desci o primeiro e segundo degraus e vi escrito: "Fé e Esperança". Só podemos ter esperança através da fé. Esta é o que nos leva a Deus. Mas muitas vezes eu descuidei da fé... Mas acredito que tentei fazer o melhor.

No terceiro e quarto lia-se: "Compaixão e Perdão". Ali eu vi quantas vezes tive a chance de perdoar e não o fiz. Vi que muito daqueles que necessitam, passam invisíveis aos nossos olhos. Faltam-lhes muitas vezes apenas um simples pedaço de pão, uma palavra, um abraço, uma lágrima ou um gesto fraterno.

No quinto e sexto estava escrito: "Paciência e Respeito". Quantas vezes nos aborrecemos com o excesso de trabalho, com o choro de uma criança, com reclamar de um idoso, com o trânsito, com a fila, com o barulho, com quem juramos viver o resto da vida... Esquecemos que paciência é um sacrifício por respeito ao tempo. O tempo é a pérola mais preciosa da vida. Precisamos compreender o que ele nos apresenta. Em cada minuto vivido se pode extrair um ensinamento.

No sétimo e oitavo degraus tinha: "Inteligência e Dedicação". Não adianta ter conhecimento acumulado sem fazer uso da ação. Também não adianta esforço algum sem compreender o seu significado. O sucesso é fruto dessa combinação.

No nono e décimo degraus via-se: "Família e Amizade". Muitas vezes o melhor amigo está na sua família, como muitas vezes você tem uma família de verdadeiros amigos ou ainda, alguém sem nenhum parentesco te ajuda com se fosse da tua família.

Por fim, no décimo primeiro e segundo degraus estava escrito: "Amor e Renuncia". Amar é renunciar o que lhe há de mais valioso sem esperar nada em troca. Quantas vezes renunciamos alguma coisa esperando uma recompensa. Se renunciar todos os valores e bens de tua vida, sem amor, de nada servirá. O amor e Deus são reflexos sem a necessidade de espelhos. Quem sente um, sentirá ou outro.

Apesar de nunca ter lhe visto, tenho a certeza que agora saberemos o que é essa despedida. Você um dia também descerá essa escada e perceberá que ali, em cada degrau, poderá ter até mais coisas escritas. Para alguns isso leva poucos anos, para outros, a vida inteira. Mas hoje eu desço para nunca mais subir esta escada. Você vai voltar. Vai subi-la e não vai mais me encontrar lá. Eu vou deixar apenas um pouco do meu cheiro, talvez nas flores que cultivei, talvez no corrimão dessa escada, talvez na tua lembrança...

Queria apenas te fazer um pedido. Tente ler cada um desses degraus em cada dia que subir ou descer essa escada. A vida é breve e não importa se subimos ou descemos escadas. O que importa é o significado de cada degrau. O degrau que te faz descer, é o mesmo que te ajudará a subir. A não observância do significado de um degrau te fará descer na escada da vida, assim como a sua percepção e prática do que ali está posto, te fará subir.

Não preciso dizer para onde vou. Apenas levo uma enorme saudade e a certeza que um dia iremos nos encontrar...

À Janiere (in memorian)

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

De onde vem esse som?



Onde estará o mistério disso tudo?
Não queria ouvir, apenas falar
Onde está a língua? Eu fiquei mudo
De onde vem esse som? Quero escutar

Esse som não é para se ouvir
A tua alma precisa de emoção
Só o espírito poderá sentir
Esse som vem lá do coração

E sempre quando tu perdido estavas
Mandava-me que Eu fosse às favas
Nunca escutou os chamados Meus

Havia um vazio que a ti matavas
Ela ajudou que quebrasse as travas
E a perceber que aquele som era de Deus.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Siga seu coração e seja feliz!... Se puder



Vou contar essa história em duas partes. Não quero chamar de testemunho, mas de uma pequena reflexão sobre as escolhas que constantemente fazemos. Alguns escolhem racionalmente, outros combinam razão e sensibilidade. Porém, ainda existem aqueles que seguem o coração e...

Desde a minha infância segui o meu coração. Detestava seguir regras. Mesmo sabendo que elas estavam certas e que o preço da transgressão iria doer bastante em minhas pernas. Apanhava seis meses por ano. Se tivesse apanhado ontem, hoje me comportava. Mas amanhã já me sentia com o crédito de fazer mais uma peripécia. Ainda hoje não sei se eu era danado ou apenas desafiava o que estava posto. A verdade é que sinto muita saudade daquele tempo.

Antes de ir buscar o leite, era preciso varrer a casa. Minha mãe era costureira, meu pai um simples vigilante. O salário não dava para ter uma empregada e eu tinha que ajudar nos serviços da casa. Eu costumava quebrar as regras nos "mandados". Por volta das oito da manhã, eu deixava a vasilha com dona Eliete, uma leiteira baixinha e gorda, dizendo-lhe que voltava já. Balela!!! Eu simplesmente sumia! Quando não ia jogar bola, acompanhava os garotos mais velhos que iam caçar de "baladeira", tomar banho no rio ou pedir emprestado as bananas dos sítios da vizinhança. Chegava as vezes seis horas da noite. Uma surra, é claro! Depois o castigo. Mas tinha que ter a "pisa".

Na adolescência, por volta de 1985, assistia com entusiamo o Super Special com Serginho Café, depois com atual apresentador do Pânico na TV. Conheci o U2, A-ha, Pink Floyd, Menudo, Legião Urbana, Titãs, Paralamas, Barão Vermelhos entre outros. Foi uma época tranquila até eu me apaixonar. Comecei a trabalhar aos 13 anos numa gráfica, picotando passagens, mas como sou curioso, aprendi rápido e passei a ocupar a função de compositor tipográfico. Estudava a noite. Não tinha tempo para namorar. Qual a solução? Quebrar a regra, seguir o coração. Deixei a escola! Perdi o primeiro ano do ensino médio e três meses depois, a namorada. Esta, a principal causa de ter deixado a escola.

Fui a um retiro espiritual e lá comecei a namorar com uma moça três anos mais velha. Ela morava na mesma rua da minha ex. Queria lhe fazer ciúme. Eu era virgem com 16 anos. Meus pais preocupados me alertaram sobre gravidez. Eu não segui a regra deles. Segui a dela: "transar sem camisinha 14 dias contados a partir do primeiro dia da menstruação"! Dane-se a razão! Não me pergunte nada. Eu tenho uma filha linda com 22 anos e dela um netinho com dois anos. Copiou o pai. Pois é, fui pai com 17 anos e... tudo tem um preço. Antes de completar dois anos me separei.

Lutei para mudar a inconsequente "quebra de regra" através do estudo. Em 1989 fiz vestibular para Engenharia Elétrica em Campina Grande e fui reprovado. Fui aproveitado com a segunda opção em Cajazeiras-PB no curso de Ciências. Lá eu conheci a pessoa que se tornou, depois de 3 anos de namoro, a mãe dos meus outros dois belos filhos: minha cantora e um apaixonado por informação. Depois de um ano fui aprovado para cursar Engenharia Civil em Campina Grande. Ela ficou cursando Ciências e eu pegando carona no Serrotão a cada 15 dias quando queria vê-la. Depois de 2 anos, quebrei novamente a regra, deixei o curso e voltei para Ciências, ou melhor, para a namorada.
Esta foi uma fase próspera. Dávamos aula nos colégios e cursinhos da região. Eu física, ela biologia. Construímos um lar e traçamos vários projetos.

No final de 1994, fomos aprovados num concurso público. Eu na capital paraibana, ela no interior. Depois de um ano, fiz o que ninguém faria: uma permuta. Segui meu coração. Saí da capital e vim para o interior. Essa foi uma quebra de regra com meus estudos. Tinha feito o concurso para o sustento num mestrado em física. Vivíamos relativamente bem. Tivemos alguns problemas, mas todo casal tem. Poderia tê-los vencidos se não tivesse queimado a minha adolescência e ouvido os conselhos dos meus pais.

Numa noite quente de setembro de 2000, encontro num bar uma menina 10 anos mais jovem que eu. Nela eu vi a possibilidade de reencontrar o espírito jovem de adolescente. Eu precisava de uma companheira que violasse as regras comigo. Uma companheira para ir a todos os bares e estar comigo nos horários mais absurdos, transgredindo as regras. Fui me envolvendo clandestinamente com ela até que um dia confessei tudo para minha esposa. O mundo caiu, mas mesmo assim, ela se esforçou para que tudo não terminasse. Várias pessoas vieram me pedir para que eu analisasse tudo o que estava deixando. Segui meu coração. Saí de casa e fui viver a suposta adolescência no início de 2001. Essa foi a mais drásticas de todas as transgressões. Eu e minha concubina fizemos muita gente sofrer. Ela penalizada pela família, eu estigmatizado pela sociedade, minha família violentada pela minha nova escolha. Tive muitos remorsos e conflitos por tudo isso, mas tinha seguido meu coração... e o coração nunca erra!

Convivi 9 anos com ela. Uma vida extremamente senoidal, entre altos e baixos, idas e vindas, até que em setembro de 2009, decidi ou decidimos por um fim. Eu sou muito difícil, reconheço. Mas também tenho uma alma boa. Mas esta história irei contar na segunda parte, onde farei uma abordagem dos últimos anos e meses, das pessoas que me decepcionaram, das alegrias, do amor, do medo, da dúvida, do suicídio, da esperança, do encontro com Deus... Aguardem!

Aqui peço licença para interromper a primeira parte e dela extrair o objeto para uma reflexão.

Se tivesse que acertar tudo, caminhar em linha reta, comer arroz com feijão todo dia... Seguir a receita de bolo elaborada pelos nossos avós... Certamente não teríamos experimentado a vida e suas possibilidades.
A vida é uma grande experiência. Um grande restaurante de relações com um enorme cardápio. O menu versa sobre uma variedade infinita de razões e emoções. Alguns comem pouco, outros vivem sempre famintos. Ora usamos a emoção para escolher a razão conveniente, qual a melhor entrada, acompanhamento, sobremesa, bebida, etc. Ora usamos a razão para fazer o processo inverso.
Nessa escolha, sempre existiu pratos que ainda não degustamos. A escolha errada pode causar mal-estar, diarréia, vômito e até botulismo em nossa alma, em nosso espírito e nas relações que contraímos.
Todos os dias escolhemos a nossa alimentação. Um dia nosso corpo responderá sobre o que ingerimos em nossa vida. Corpo, alma e relações se alimentam.
O corpo tem um coração: um músculo bombeando sangue ininterruptamente. O amor, o ódio, a alegria, a tristeza, a consciência representam o coração da alma. Os contratos, acordos, o casamento, a amizade leal, a cumplicidade representam o coração das relações.
Seguir o coração é delicado. A impulsividade de uma decisão pode afetar aos vários tipos de corações. Alguém pode enfartar, pode ficar triste ou com ódio, destruir um casamento...
Peço perdão a Deus e a todos que magoei por ter seguido o meu coração. Um coração egoísta, frio, que só serviu para atender meus impulsos. Nunca coloquei Deus em minha escolhas. Agi por conta própria...

Sempre imaginei que "o dogma é uma repetição que arranca o prefixo da inverdade". É até bonito esse papo filosófico, mas a vida e as relações afetivas são mais importantes que um discurso de botequim. As vezes precisamos seguir regras com as quais discordamos em sua essência. O pior não é a pena que a regra encerra, mas o efeito borboleta gerado a partir dela. Se fizer A, terá um pena B. Até aí tudo bem! Mas B pode alterar C, que nega D, que interfere em E, e este, corrompe F que engana G, que vicia H que convence I a matar J.

Por tudo isso, não siga o seu coração. Não o conduza se ele for um veículo. Peça a Deus para dirigir. Se tiver pernas, peça a Deus para ser o caminho. Se tiver asas, peça a Deus para ser o ar.
Quem quiser me condenar por ter seguido meu coração, faça-o! Condene-me! Eu mereço. Mas não use seu coração para ser o juiz. Use-o colocando Deus para me sentenciar. Aquele que não o fizer, estará incorrendo no mesmo erro que cometi.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Meu companheiro



Tu sempre me protege da frieza solitária que se estampa nas paredes da minha alma.
Sempre busco o teu refresco quando minhas idéias estão turvas, quando as portas se fecham, quando o remorso me instala e a lâmina de barbear foge do meu rosto querendo me acertar os pulsos.
Tu sabes das minhas ressacas, escutas o grito de negação daquilo que bebi, mas que ontem tinha me aliviado de várias dores. Tu as vê nas marcas de expressão que o tempo e a noite esculpiram no meu rosto banido.
Finco as minhas mãos no teu assento, lembrando ombros, e vejo os meus ébrios olhos a tremular, espelhado naquela água de esmeraldas biliar.
Ali questiono se tudo valeu a pena... Passo a mão na minha face, tento limpar o suor daquele esforço intra-orgânico: valeu, mas até quando?
Os livros são teus amigos, pois tudo o que aprendi neles, dividi um pouco contigo, visto que só lia em voz alta. Sentado em teu trono, incontáveis planos de vida ali eu fiz. Alguns realizei, outros destruí, mas um estou esperando...
Tu estavas comigo no trabalho, na casa dos meus pais, nos bares e restaurantes, nas rodoviárias e aeroportos... És sempre visto sem grande importância, mas todos sabem do teu valor quando as coisas apertam.
Por várias vezes via naquilo que te reveste formas lúdicas, frutos de minha imaginação, parecendo um diálogo visual de linhas e curvas abstratas...
Tu és quase uma igreja, um templo, um rio sagrado que limpa não só as sujeiras exteriores mas também as impurezas espirituais.
Tu já presenciastes não só as minhas orgias e volúpias amorosas, mas a de várias pessoas. Elas te adoram nessas horas. Tu assiste a tudo silenciosamente e depois faz a limpeza do produto oriundo do desejo carnal. Nesse momento, todos nós parecemos atores de filmes pornográficos e tu a lente que capta tudo. Quantos segredos já te contaram?... Milhões! Mas nunca revelastes nenhum.
Em locais públicos, existem aqueles imbecis que costumam te tatuar com palavrões e desenhos obscenos ridículos. Todos irão concordar: quando tu se arruma e fica perfumado, todos levam uma grande impressão do ambiente em que se encontras.
Você na minha casa é especial! Posso ficar com a porta aberta, pode sair cheiro ruim, não importa... Não gosto de você em nenhum outro lugar! Te acho estranho quando estás fora de minha casa, não me sinto a vontade contigo, acredite!
Poderia te chamar de Oráculo, pois oráculos são seres humanos que fazem predições ou oferecem inspirações baseados em uma conexão com os deuses. No mundo antigo, eram os locais que ganharam reputação por distribuir a sabedoria. Isso você sempre me proporcionou.
Vou entrar com um pedido de reconhecimento de união estável. Todas as outras pessoas te chamam de banheiro. Eu inverti esse "b", transformando num "p". Depois coloquei o "com", visto que sempre dividi parte da minha vida contigo. Agora juntando "com" + "p" + "anheiro", gerou: companheiro. Parece idiota, mas o banheiro foi sempre meu companheiro.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

O jardim me falou que eu era água...



Hoje acordei lembrando do sonho que tive. Eu estava num lindo jardim... Nele eu já tinha cuidado de várias espécies de plantas, mas tinha um carinho especial por três delas que passei a cuidar de alguns anos pra cá. A primeira espécie cuidei por quase quatro anos. Era um lindo cactus, gordinho, baixinho, espinhos curtos e pontas grossas. Algumas borboletas tinham predileção por ele. Olhava para as outras plantas, mas achava carente aquele cactus que parecia meio rejeitado, diferente e solitário. Quando chegava pelas manhãs, ele me olhava com um ar de ciúme, parecendo que eu não mais o queria. Sempre se entristecia quando regava as outras plantas. Precisava cuidar das outras espécies... era com uma terapia. Eu cuidava para me sentir útil. Conversava com todas as plantas, especialmente com meu cactus. Com o tempo percebi que as outras plantas estavam ficando feias e dei atenção especial para elas, rejeitando um pouco o meu cactus baixinho. Revoltado, ele desenvolveu uma espécie de veneno, afinou as pontas dos espinhos e quando fui regá-lo, ao passar-lhe a mão como um gesto de caridade, ele me furou e o veneno desenvolveu uma alergia em meu corpo, manchado-me com marcas horríveis... tive uma crise nervosa, pois era visível e leproso todas aquelas manchas. Várias pessoas souberam desse fato. Não cuidei mais dele. Ele foi removido do meu jardim por outra pessoa que o colocou em um vaso e lhe dá, até hoje, toda atenção. Na verdade, eu não queria cuidar dele por muito tempo.
A segunda espécie cuide por mais de um ano. Ela era uma linda roseira. Entalada num belo vaso de porcelana chinesa, tinha pequeno porte, galhos finos, as vezes delicada, as vezes espinhosa. Foi muito difícil furtá-la do jardim da senhora Mael. Suas pétalas perfeitas pareciam poesia para meus olhos... seu perfume, um odor de poema para as minhas narinas. Muitas pessoas admiravam aquela pequena imponência. Por ter sido roubada, só a regava escondida. Tive que escondê-la praticamente de todos. As vezes no matagal, as vezes num muro abandonado, debaixo da cama, embaixo da ponte, nos refúgios mais esquisitos de minha cidade. Minha família dizia que aquele tipo de roseira era uma espécie de droga. Papoula da Índia, flor da Tailândia, sei lá... só sei que admirava todo aquele encanto. Quando brotava, aquele botão parecia escrever em minha alma, ficando uma união interminável. Seu cheiro me embriagava e eu simplesmente fugia de mim mesma. Vez por outra seus espinhos me espetavam e aquelas rubras gotas de sangue eram usadas como tinta para pintar o meu destino. Ainda hoje não sei porque gostei tanto daquela roseira...
Acho que queria ser uma abelha para carregar o seu pólen...
Dedique-me tanto a essa roseira que esqueci as outras plantas do meu jardim. Penso que só reguei duas delas, mas poucas vezes. Li muito sobre roseiras e até me empenhei para reproduzir aquela espécie. Depois de muito tempo, já me achava dona dela e acreditava tanto naquela beleza que passei a me sentir um pouco de sol, terra, sais e água para ela. Mas nem tudo é perfeito! Num belo dia, coloquei-a em frente ao meu jardim, apresentando-a em desfavor das outras espécies que ali estavam... Como se fosse um castigo, a senhora Mael passeava por lá e notou o seu vaso colorido de porcelana. Imediatamente agiu de maneira inteligente, colocando as razões que lhe eram justas sobre aquela roseira e a levou consigo. Fiquei extremamente revoltada, pois aquela roseira parecia ser totalmente minha. Se mostrava viçosa quando a regava e aquilo tudo era um sonho dentro de outro sonho... Quase não consigo passar em frente aos jardins, sempre lembro dela e isso me perturba. Seu cheiro, sua forma quase silábica de suas pétalas, faz-me relembrar um daqueles romances medievais, com paixões fervorosas e finais trágicos. Sempre que falo ou escuto falar de roseiras, não consigo esconder o que sinto por ela. Tento esquecê-la, mas é difícil... Contrário ao cactus que me marcou por fora, a roseira marcou minha alma, meu coração...
A terceira espécie, estou cuidando há cinco meses, mas ainda não consegui defini-la... Pensava que era uma trepadeira... mas dá fruto. Pode ser uma videira...
Ser for mesmo, qual tipo de uva ela será? Malbec, Shiraz, Merlot, Cabernet Sauvignon? Não importa... já aprendi muita coisa com essa nova planta. Ela parece carregar uma loucura harmoniosa, uma sensibilidade visível em cada folha, um cheiro lírico parecendo ter arte e sabedoria sobre várias coisas... Deixa sua impressão através de seus tentáculos herbáceos em cada pessoa que a toca. Preciso limpar as ervas daninhas que a rodeiam e cuidar bem para não ter nenhuma praga na minha possível videira. Dela sairá a uva, matéria-prima da bebida do amor, alimentos das paixões, combustível dos corações enamorados... Essa planta foi cultivada lá pelas bandas da Paraíba. Ela cria uma forma de cobertor vegetal para proteger os seus filhotes que estão próximos de suas raízes. Parece que outras plantas adoram a sua sombra. Eu, que pouco reclamo do seu desenvolvimento, espero sentir o amor que senti pela roseira, já que o desejo que tenho em consumir o seu líquido precioso, é sem dúvida, o maior de todos.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Será que permaneceremos?


Há muitos anos, a filosofia, ciência e religião buscam em seus respectivos processos de explicação elucidar ou impor as respostas que sempre incomodaram a humanidade. De onde viemos e para onde vamos? Quem criou ou o que criou tudo isso com tamanha perfeição? O universo é único ou existem outros universos? A grande indagação filosófica parece ter mudado o foco nos últimos tempos. Questões mais importantes estão sendo feitas através de pensadores, cientistas, religiosos, ativistas... A pergunta é: Como iremos permanecer aqui? Este é o nosso mundo e teremos que cuidar dele para que continuemos a habitá-lo. Nosso sistema solar não é eterno e um dia irá "morrer", mas isso demora mais de 6 bilhões de anos... não se preocupe com esse fenômeno! Devemos observar o que em menos de 200 anos conseguimos fazer com o planeta buscando "evoluir" tecnologicamente. Veículos, produtos químicos, desmatamento, água, lixo, guerras e um egoísmo incontrolável da humanidade. Crescer, capitalizar, globalizar, ser competitivo, ser forte tecnologicamente... Receitas, cursos, trabalho, concorrência e tudo isso por qual motivo? Não sabemos de onde viemos e nem pra onde vamos, lembra? E como permanecer? Dessa forma não saberemos o que fazer. O nosso desejo em conquistar, vencer, ser materialmente melhor é mais que tudo e nada pode nos conter... Chamamos os índios de preguiçosos e não aprendemos que a sua filosofia de vida é muito mais sábia que a nossa. Preservar é questão de ordem para a continuidade da espécie humana. Já disseram que o homem é um ser inviável, é lobo do próprio homem e é um ser que pensa que pensa. Analise um pouco e perceba o que as pessoas que estão próximas de você estão pensando neste momento, o que querem e esperam da vida, o que fazem para melhorar o ambiente onde vivem. Estamos a todo instante poluindo, diretamente ou por tabela, o nosso meio. Não fique neurótico tentando consertar o mundo, mas tente melhorar o seu espaço com pequenas atitudes. Menos plástico, vidro jogado fora, pilhas velhas, economizar água, energia, preferir andar a pé ou bike... Se multiplicássemos essas atitudes por 6 bilhões de pessoas que há no planeta, não estaríamos discutindo porque o sol vai morrer em 6 bilhões de anos.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Os olhos não enxergam suas próprias lágrimas

Minha matemática, minha física, minha lógica, minha filosofia, meu “direito torto”, meus gráficos, meu cantinho, minha dose, meu sangue, meu pedaço de verdade... Para onde vocês foram? Sempre fui além do que precisava buscando entender o meu tempo, meu espaço, meu deus, meu cosmo. O olhar que lanço para o céu a noite é muito mais que um admirar-se com o brilho das estrelas e da lua. Ele vai pra outras dimensões, sai da via láctea e viaja pelo universo procurando uma compreensão de quão pequenos somos, perdido nesta poeira cósmica, nesta escuridão infinita. Queria saber se estamos ligados de alguma forma com outros mundos, se existem outras formas de vida inteligente, se toda a matéria que é engolida num buraco negro cria uma singularidade, gerando outro espaço-tempo, outro universo, carregando um pouco de nós. Mas apesar desse olhar, dessa compreensão, sinto-me vazio, sem esperanças, sem vida, sem alegria... Não quero sair, não quero entrar, não quero lembrar e nem dizer nada... Que mundinho pequeno que habito!... Mas é meu. O único que tenho.
O telefone toca e um convite é feito pra algo que não queria fazer. Não naquele momento! Mostro-me a fundura do poço que estou e não quero escada, corda ou mão para ser resgatado. Quero ficar ali mais um pouco. Depois de um concordar sem palavras, vou ao banheiro e molho minha cabeça com um leve desejo de ânimo. Acorda! Pede ajuda!...
É uma noite linda, mas só vejo luzes e blocos de concreto amontoados formando essa selva urbana. Olho a perimetral, avenida que faz essa pequena cidade parecer uma capital, vejo carros indo e vindo com destino apenas para o fundo de minha retina. Sigo aquelas luzes imponentes e vou buscar o meu ouvido, minha mente e meu consolo. Carrego-a por toda a cidade, observando a felicidade alheia em cada esquina, cada bar, cada calçada...
Perco-me um pouco nessas faces buscando enxergar minha alma, mas nada importa se eu não encontrá-la.
Remonto toda a falta de expectativa em mim mesmo querendo receber um empurrão de cima do meu penhasco emocional. Queria ouvir as mais sábias palavras... Eis que o milagre acontece!
Não com palavras. Mas com um olhar carregado de lágrimas dividindo a dor que me consumia. Ali eu senti o quanto somos ingratos e pequenos diante de Deus. Ele estava ali do meu lado através dela, minha doce esperança, vestida de mulher, com coração de criança, com gestos simples e sinceros arrancando a estaca que me atravessava o peito. Foi exatamente no brilho daquela lágrima que entendi a grandeza do cosmo, o universo além de mim... A falta de esperança não estava em mim, mas no meu egoísmo, na presença espiritual que abandonei, na falta de compreensão para com o outro que me completa...
Ali eu tinha entendido o tamanho do meu mundo, há quantos anos-luz estava de mim mesmo.
Isso é perturbador. Essa simples gota salgada quando dividida com sabedoria e compaixão, transforma chama de velas em quasares de brilho transcendental, pequenos passos em viagens intergalácticas dentro de sua consciência e no seu eu...
Busquei através de quase tudo o que vivi entender um pouco do mistério que é a vida, a felicidade, o cosmo... Mas nada havia encontrado.
Foi só então, quando dividi meu choro contido, aí sim, vi em cada uma daquelas lágrimas o reflexo daquilo que eu buscava.