quinta-feira, 29 de julho de 2010

Vamos comemorar?



Aos contornos que a vida encerra sempre nos deparamos com histórias interessantes. Histórias que nos fazem acreditar que a vida vale à pena. Conheci um casal latino numa dessas rodoviárias do interior do nordeste. Não lembro a cidade. Por coincidência perdemos o mesmo ônibus e ficamos a espera por mais de 10 horas. Conversamos sobre diversos assuntos, sobre filhos, relacionamentos e as surpresas que a vida no reserva.

Ele se chamava Enrico, 24 anos, magro, 1,67m, moreno, sorridente, bacharel em direito, recém desempregado, amante da literatura e grande sonhador, literalmente. Ela se chamava Lisa. Morena clara, forte, prestes a completar 41 anos, 1,71m, professora da área de exatas, funcionária pública, amante da arte, filosofia e uma errante, apaixonada pela vida. No primeiro instante achei gritante aquela aparente diferença física e de idade. Mas depois de conhecê-los vi que havia uma grande completude no casal.

Enrico viveu dois relacionamentos sem resultar filhos. O primeiro durou quatro anos recheados de ciúmes e desconfianças, a quem ele intitulou de relação doentia, eivada de psicopatia, com término não agradável para a sua moral. O segundo fruto de uma fantasia idealizada por ele mesmo, Enrico se apaixonou por uma professora de literatura, que alimentava através de seus contos a falsa promessa de amor verdadeiro. Ela dizia que iria se separar para viver com ele. Esse talvez tenha sido seu maior erro. O alce que acreditou na onça. Enrico viveu esse romance por mais de um ano e ficou a ver navios. Ela ainda insiste em relatar através de contos sobre a estória que os dois tiveram. Ele ainda mantém sua curiosidade ativa.

Lisa viveu três relacionamentos com saldo de três filhos. O primeiro foi um relacionamento adolescente e resultou uma filha. Durou menos de dois anos. O segundo durou quase dez anos. Uma relação aparentemente estável, tanto afetiva quanto financeira. Os outros dois filhos são frutos desta relação. Lisa casou-se com um professor de biologia de nível técnico e ambos ensinavam na mesma escola. O término deste se deu por conta do seu terceiro relacionamento. Lisa desprezou os valores mais dignos da família para viver uma relação irresponsável. Todos aqueles que a conhecia reprovaram sua atitude. Esse relacionamento foi uma verdadeira bagunça na vida de Lisa, conferindo apenas direitos para o diabo que entrou em sua vida. O demônio quando quer ver a infelicidade de uma família não manda recado, ele é o próprio portador da maldade. Depois que Lisa tirou a venda dos olhos e enxergou os seus familiares que há muito tinha esquecido, saiu daquele inferno e passou a trilhar outro caminho em busca de uma vida melhor.

O erro cometido por Lisa teve um lado bom. Fez com ela se encontrasse com Enrico. Parece divino. Duas pessoas que moravam na mesma cidade há anos e não se viam, numa única semana se encontraram três vezes. Deus queria esses dois juntos!
Os dois se conheciam vagamente, mas nunca se imaginaram juntos. Lisa soube do término do primeiro relacionamento de Enrico e propôs uma amizade para falar de suas experiências desastrosas. Ali começou um olhar interessado de Lisa por Enrico. E uma semana depois... Advinha?... Os dois descobriram a paixão e o amor floresceu.

Lisa, lisa de esperanças ficou com Enrico, rico de sentimentos. As operadoras telefônicas agradecem. Eles se falam pelo menos 10 vezes por dia. Os postos de gasolina também. Eles se revezam atravessando a cidade para se amarem todos os dias. Viajam e viajam. Escrevem, choram, sonham, resmungam, brincam e se amam e escrevem, se amam e sonham e se banham, se amam e se amam...

Esse sim é real, verdadeiro e latino. Sem fantasias, sem mentiras, sem desculpas.
Lisa é a mulher que há no homem e Enrico o homem que há na mulher. Será que eu os conheço?... Não importa! Mas agradeço a Deus por saber e experimentar dessa história. Agora nós devemos comemorar.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Não adianta fugir, você está preso!



E se a história tivesse sido outra?... E se viajasse no tempo?...
Será que dava para realizar todos os sonhos e desejos?

Alguém me disse que tinha sonhos. Contou-me de alguns desejos e que sua vida seria bem mais feliz quando realizasse esses sonhos e consequentemente os desejos. O homem deseja sempre e sempre lhe está faltando algo ou alguém. Tão logo realiza seus sonhos e desejos, o homem passa a buscar outros e outros sonhos, outros desejos...

Nesta longa jornada de busca, realizações e frustrações, nossa história individual acaba se misturando com a de outras pessoas. Nossas escolhas individuais não são tão individuais como pensamos. Um relacionamento entre dois indivíduos pode gerar uma família. Assim como várias famílias formam uma sociedade. A sociedade sonha, a família sonha, os casais sonham, os indivíduos sonham e todos escolhem. Todos nós escolhemos, aqui e ali.

Não mudamos a história através de nossos sonhos, desejos e escolhas. Construímos a história. Uma escolha individual constrói um evento. Este será parte da história. A única coisa objetiva que temos é a própria história. A escolha é subjetiva. Somos dois pontos de interrogação com um ponto de exclamação no meio: passado(?), presente(!) e futuro(?).

Nada podemos conjecturar pelo que passou simplesmente pensando se a escolha tivesse sido outra. Já passou e não se muda o passado. Mesmo vencendo o espaço- tempo, como no filme Déjà vu, através de um atalho chamado "buraco de minhoca", retornando ao passado para “consertar” a história, mudar-se-ia apenas um evento e não toda a história. Mas isso é muitíssimo improvável!

A história é composta de todos os eventos ocorridos num instante, num dado momento, numa determinada época. Porém nem todos os eventos estão associados. A maioria deles estão isolados, outros fracamente vinculados e só o próprio universo é vinculado a tudo. Teríamos que mudar o universo para mudar a história de todos os eventos.

Por outro lado, considere que A, B e C sejam respectivamente os instantes correspondentes ao passado, presente e futuro. Se fosse possível a “viagem” de B para A através de um atalho no espaço-tempo, A seria agora então o presente e B o futuro. BA seria uma viagem ao passado e AB o retorno para o futuro. Portanto poderíamos também fazer as viagens BC, AC e CA. O espaço-tempo seria uma circunferência com pontos distintos representando os instantes A, B e C.

Desta forma, ao escolhermos qualquer um dos pontos para representar o presente, os outros dois seriam o passado e o futuro respectivamente. Configurações como ABC, BCA e CAB seriam possíveis. Ainda poderíamos tornar tão pequena essa circunferência que os pontos chegariam a se coincidir. Imagine o menor intervalo t possível. Você pode dividir ainda em três sub-intervalos representando os passado, presente e futuro. No limite estaremos sempre no presente. Portanto, passado e futuro são formas espaço-temporais de representar o presente.

Olhe para seu relógio analógico e fixe no ponteiro dos segundos. Veja o movimento do ponteiro transformando presente em passado. Antes que ele chegue ao próximo marcador, fixe seu olhar. Você está “olhando para o futuro”. O marcador que você olha agora é presente, daqui a 1 segundo é passado e daqui a 59 segundos é futuro. O que faz o tempo se comportar assim?

Pense agora se fôssemos imortais e imutáveis? Certamente não existiria a noção e nem a importância conferida ao tempo. Os sonhos e desejos poderiam ser realizados daqui a uma hora ou daqui a mil anos. Isso não era problema. Isso não era importante. Nossos sonhos e desejos estão atrelados ao desconhecimento que temos em dominar o tempo. Nossas escolhas são feitas no tempo e a ele retornaremos para agradecer ou se lamentar. Pensamos sempre que o tempo vai acabar.

A vida que se transforma em morte, se transforma no tempo e no espaço. Mesmo para aquele que está aprisionado numa cadeia, o tempo para ele é pequeno. O tempo que lhe restará ao cumprir sua pena. Quer fora ou dentro de uma cela, seremos sempre prisioneiros. Prisioneiros dos sonhos e desejos. Prisioneiros das nossas escolhas. Prisioneiros do tempo. Essa é a nossa história. Mesmo que voltemos no tempo e alteremos parte dessa história, não teremos mudado o tempo. Apenas desviado o seu percurso e retornado para a prisão.

Ironia: Aos homens "grandes" que não sabem o que são "pequenas" mulheres


Um homem não é medido pela
sua altitude, mas pela sua atitude.

João Noilton da Costa


— Ah não! Se não tenho inspiração, eu a invento.
— Ah não! Não importa de onde ela venha. Pode ser de uma dama, de uma menina, de uma mulher, de uma puta...
— Ah não! Ao lado de minha dose tudo é possível, é fácil demais, mesmo que muitas vezes seja nojento descrever meus lindos encontros...
— Ah não! Com minha literatura eu sou um grande homem...
— Ah não! Já usei diversas mulheres para escrever e descrever os motéis desta cidade, como foi o último gozo e a cara de cada uma delas acreditando que eu as amo.
— Ah não! Divulgo como faço, fiz e vou fazer para achar minha inspiração.
— Ah não! As mulheres são damas idiotas quando as descrevemos em um poema e que eu, somente eu, sei escrever muito bem.
Ah não! Eu sei fazê-las se sentirem grandes quando as divulgo de forma vulgar.
— Ah não! O sentimento é piegas, é apenas uma pitada, um enfeite, um detalhe.
— Ah não! Mas eu gosto de todas elas e quero que elas sejam felizes, mesmo que vez por outra eu atrapalhe seus sentimentos com outras pessoas quando escrevo o que fiz com elas... Isso mostra como eu sou bom demais naquilo que eu conto.
— Ah não! Tu sabes o que é pior?... Elas acreditam! Elas adoram... Lêem mesmo sabendo que é tudo mentira... Ficam com raiva, sei lá, felizes, lisonjeadas, mas adoram fazer a leitura...
— Ah não! Mas aquela coitada que eu deixo em casa, essa meu amigo, eu não deixo não! É meu porto seguro!
— Todas as vezes que eu uso uma dessas fantasias amorosas, quando eu volto pra ela, minha verdadeira dona de casa, é aquela lua de mel...
— Ah não! Não diga que eu sou pequeno! Eu sou?... Ah não!

Ah Sim! Eu não sou escritor e nunca pretenderei ser.
E também não confunda 'Ah não!' com homem pequeno, tenha certeza.

Excesso



Cesso o meu buscar porque já não encontro.
Cesso o meu olhar, pois já não encanto. Sobrou-me o pranto.
Cesso a minha fala porque já não escuto... tudo cala.
Cesso a minha dor por já ter me acostumado ao câncer dos meus dias.
Cesso a minha lágrima por não ter mais rosto para escorre-la.
Cesso a minha esperança, pois já não tenho sonhos.
Cesso o meu desejo porque mutilaram meu corpo.
Cesso o meu caminhar por não saber aonde ir.
Cesso a minha alma por não acreditar no homem.
Cesso a minha alegria por não ter mais sorriso.
Cesso a minha verdade por ser réu confesso.
Cesso o meu excesso por amor
E por amor te peço...
E pelas mãos não faço...
E pela noite esqueço...
E no vinho fracasso...
E neste corpo em pedaços
Cesso o meu amor por amar em excesso.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

E quando eu sentir saudades...



Brasil 1 x 0 Holanda. Nunca vi tanta euforia na casa da minha mãe. O berro da vuvuzela combinado com os gritos da minha mulecada estourava os ouvidos do meu pai. Ele, cansado de sua obra inacabada, parecia já saber o resultado final, quase que irritado com aquele barulho. Minha mãe tinha certeza, mas a festa era nossa. Quase não se via o jogo, apenas comemoração. Nunca fui tão feliz na vida. Meu neto, meus filhos, minha Naya, Gracinha que lava celular, todos apostando naquela vitória já certa. Eu fui atrevido e apostei 5 a 1 para o Brasil. O sonho durou pouco e nem preciso contar como terminou o jogo.
Aquele jogo tinha sido o fato da minha filha e meu neto ainda não terem partido para terras paraguaias. Creio que se o Brasil tivesse vencido, eles tinham ficado mais tempo. Naquele momento comecei a sentir saudades. Saudades de ir a Sousa, saudades do terceiro andar, terraço do Troodom Park Hotel, saudades dos passeios de uno, saudades de lhe dar massagens, saudades de não ter ficado mais tempo ao seu lado, saudades de sentir saudades.

Depois de 22 anos abri o baú do meu coração e encontrei o amor perdido, o tempo perdido, os momentos perdidos. Porém encontrei a cumplicidade, o afeto, o cuidado que não sabíamos demonstrar um para o outro. Mas foi na última noite no Troodom que falamos da vida, dos projetos, dos sonhos, das amizades, das verdades. Era uma despedida traduzida em risos, lágrimas e atenções àquela criança travessa. Esta, insistia em derrubar as tampas dos recipientes de cerveja daquela altura para chamar nossa atenção.

Foi ali, contemplando as luzes de Sousa, apreciando o céu daquela cidade, naquela linda noite estrelada, que vi a possibilidade de não ficarmos tão distantes. Quando sentires saudades, olha para o céu e mira o cruzeiro do sul. Lá eu estarei de braços abertos para te afagar. Lá eu serei a tua referência, os teus olhos ajangaiados, tuas pernas cambotas, heranças que nos identificam. Lá também eu serei os teus erros e a esperança de vencer.