quarta-feira, 19 de maio de 2010

Onde foi que eu me perdi?...



Não me arranque as pernas, eu fugirei. Não fure meus olhos, eu já vi tudo. Não queira calar a minha voz, eu sou cigarra. Não tire minha consciência, eu sou insônia. Não me procure, eu não existo. Não me roube os sonhos, eu os recrio...
Essa coisa chamada "Eu", vive das cinzas, queimada na lareira da existência de cada um. Isso mesmo! Não somos nada além daquilo que experimentamos e que pensamos ser. Um amontoado de livros quase lidos. Um ouvido cheio de cera, meio surdo de propósito. Escutado apenas aquilo que quer ouvir. Uma cabeça suportada por um pescoço separando duas orelhas. Ora não pensa. Ora finge que pensa, ora pensa que pensa. Somos parecidos com um rio que já sabe para onde vai...
Ontem eu tive frio. Precisei me abraçar, aquecer-me e sentir minha respiração, mas eu não estava ali para dividir o lençol comigo mesmo. Eu quase sempre me abandono nas horas mais importantes. Medo, auto-piedade, masoquismo, covardia?... Não sei.
Já coloquei anúncios nos jornais daqueles que amo na tentativa de me encontrar. "Procura-se um velho moço com olhos ajangaiados que perdeu uma adolescência e que jamais a encontrou". Será que procuro o velho moço, o moço velho ou a adolescência perdida? Não consigo distinguir. Apenas disfarço e faço pose que sei de tudo.
Faço aqui um apelo para resgatar esse desaparecido: aquele que me encontrar perdido nas ruas, bebendo, sem destino, conversando filosofia barata, avise-me que irei buscá-lo para ficar definitivamente junto de mim, o local de onde eu nunca devia ter saído.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Precisava de arco-íris...



Precisava pintar minha solidão, meu escuro vazio, meu horizonte de problemas acumulados, minha alegria esquecida nas mesas de bares. Procurei em cada canto dessa cidade pincéis, tela e tintas sui generis para criar minha nova paisagem. Queria cores, vida, alegria interior. Pensei em vários ambientes bucólicos mas percebi que apenas um arco-íris me bastava. O meu outubro chegou com seu dia 15 para realizar tal desejo. Depois desse dia comecei a coletar as cores necessárias. Ela passou a ser minha aquarela. O vermelho retirei do sangue que ficou em minhas unhas, quando lhe rasguei as costas de tanto prazer. O alaranjado recolhi dos seus fios de cabelos deixados no sofá escuro, resultante de um puxar animalesco do fogo que ardia em nossos corpos. o amarelo capturei das suas unhas desenhadas com doçura e mel. O verde retirei da tua bílis encharcada de vinho e azeitona de mais uma noite delirante. O azul foi encontrado numa tanga de cetim deixada em baixo dos nossos lençóis. O anil arranquei do teu olhar profundo quando olhavas para o céu. O violeta saiu dos teus lábios, roxo de calorosos beijos mordiscados. Estava com todas as cores, mas precisava ainda do branco e do preto. Retirei o branco do teu sorriso deixando os seus dentinhos separados. Ah que sorriso inesquecível... O preto foi elaborado com sobras do teu segredo.
Pintei assim a minha felicidade, cada cor vinda de ti.
Cada traço que eu faço, não disfarço meu amor, apenas junto um pedaço, meu e teu, aqui e ali. Nosso tempo tem compasso, escrever uma história, rabiscar meu céu e com tuas tintas, colorir.