quarta-feira, 6 de julho de 2011

A cor de uma palavra


Depois de uma noite turbulenta e chuvosa, acordei com uma sensação agradável. Levantei-me e senti as juntas do meu corpo aplaudir minha disposição.

Quando saía do banheiro escutei pela TV que hoje seria um dia ensolarado. Preparei-me, tomei café, pus meus óculos de sol, peguei meu cachorro e saímos para passear. Adoro as caminhadas matinais na praça enfrente a minha casa... Um cheiro de terra molhada e mato úmido ainda estavam espalhados pelo ar.

Um cantarolar de pardais nas árvores daquela praça embalava meus primeiros passos.

Sem querer, acabei escutando a briguinha fútil de um casal que caminhava ali perto.

Ela discutia com ele a possibilidade de pintar o cabelo de ruivo mais uma vez.

E ele veementemente rebateu:

— Você em menos de três meses já pintou o cabelo de louro claro, verde papagaio, lilás e agora já quer pintar de novo?...

— Ora, eu estou no vermelho, será que você não vê?!...

Ressaltou ele indignado com a situação.

Eu, silencioso me perguntava: lilás?...

Ela, por sua vez, retrucou em tom irônico sobre o carro novo que ele tinha comprado.

— É incrível como um homem consegue gastar tanto dinheiro para comprar um carro cor de vinho... é careta demais, horrível aquela cor!... No entanto não quer pagar a tintura de um cabelo!...

E continuou:

— Para a camisa oficial do seu time de futebol você tem dinheiro! Diga-se de passagem, aquele verde limão é ridículo, não sei como alguém consegue vestir aquilo!?...

Eu e meu cachorro que testemunhava aquilo aproximamos daquele casal e eu os cumprimentei interrompendo aquela intriga:

— Bom dia pessoal! A TV noticiou que hoje seria um dia lindo, vocês concordam?... Já viram o céu, as nuvens, as plantas desta praça?...

Sem querer, acabei escutando a conversa de vocês, desculpem-me!...

— Azul, branco, verde, vinho, lilás!...

— Vocês poderiam me descrever como é o azul? O lilás? Como será descrever uma cor? Qual a sua beleza? O que é belo?...

— Herdei uma fortuna e daria tudo para ver o azul do céu, as nuvens, a cor do seu cabelo, a cor do seu carro, mas eu nasci cego...

O silêncio tomou conta daquele instante e o casal sem resposta se afastou emudecido. Só então percebi o valor da palavra para quem não pode dizê-la. O valor das minhas pernas que me conduziram até aquele local. O valor dos meus ouvidos por ter escutado aquela conversa. O valor de ter uma companhia do seu lado. Seja animal ou pessoa.

O valor do olfato em sentir o cheiro da terra molhada e a oportunidade que Deus me deu de estar ali vivo e consciente, com saúde para caminhar, sorrir e entender o seu propósito.

As cores para mim seriam importantes se eu as pudesse vê-las, contemplá-las, mas a minha fala naquele instante foi bem mais contundente que a limitação dos meus olhos.

Ali, eu pude ver com o coração a cor da minha fala.

A cor das minhas palavras.

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